segunda-feira, 4 de junho de 2007

Ocupação II

O Diogo disse que vai postar algo terça ou quarta, então vou escrever sobre um ponto que às vezes as pessoas não pensam, e que para mim é meio lógico, mas precisa ser explicado.

Porque a greve não funciona.

A greve, em si, é um mecanismo de imposição de perdas.

No século XVIII, os trabalhadores, em busca de aumento de salário e melhoria de condições de trabalho, recusavam-se a trabalhar, gerando assim perda de lucro e depois prejuízo a seus patrões. Teoricamente, quando os custos de pagar as reivindicações tornavam-se menores do que as perdas geradas pela paralização da produção, o patrão escolheria dar as reivindicações aos trabalhadores, simplesmente escolhendo o que custa menos.

Porém, na Universidade, essa estratégia falha em vários pontos.

Com a parada do ensino, quem perde com isso são os alunos, que ficam sem ver a aula, e assim deixam de aprender (entende-se que é isso que eles vão fazer lá). Mas os alunos não são os patrões; pelo contrário, são os consumidores. É como se os trabalhadores (professores e funcionários) fizessem alguma coisa (como jogar lixo no ambiente de trabalho) para prejudicar a si mesmos (já que são os alunos que saem de greve); ou prejudicassem o consumidor (contaminando secretamente produtos, por exemplo), e nem de longe causando perdas para o patrões[tá, pode-se discutir aqui que a contaminação de uma mercadoria faria com que ela parasse de ser comprada, prejudicando o patrão - mas o exemplo diz respeito ao momento em que não se descobriu ainda o que causa doença nas pessoas].

Tudo isso porque, na Universidade, os trabalhadores não geram riqueza (capital); eles geram conhecimento. E o chefe não paga, porque quem paga são os contribuintes, que em sua maioria não são beneficiados pelos gastos dos alunos na faculdade. Ou seja, o único que perde com a greve é o aluno, que deixa de usufruir da sua posição privilegiadíssima, quase parasitária.

E não perde só o conhecimento, como seu tempo.

Soma-se a isso o fato de que em todo mês de maio de ano ímpar acontece uma greve, fazem pelo menos 7 anos. Ou seja, um instumento já inoperante teoricamente é desgastado por ser mais rotineiro que o ano bissexto.

Por que os alunos saem de greve, então?

A resposta, para mim, é porque alunos de primeiro e segundo ano (em sua maioria) são engambelados pelos grupos politiqueiros parasitas (esses sim) da universidade. Esse é meu terceiro ano na faculdade, e minha segunda greve; meu professor está na faculdade a 5 anos e é sua terceira greve, e o que eu vi na primeira greve ele disse ter visto na passada: as coisas não mudam. Não mudam porque, quem ganha com a greve não são os alunos (vistos que o modo de ação descrito aqui nunca poderia dar certo), mas sim esses grupos politiqueiros, que vivem da arrecadação de dinheiro de sócios e precisa aparecer todo dia de matrícula e primeira semana de aula na porta de todos os prédios da FFLCH.

5 comentários:

Diogo Bardal disse...

hehe vale lembrar que no século XVIII e XIX, era comum além da greve "strike", que era a parada de uma categoria de trabalhadores em uma ou mais fábricas. havia também o "lockout", que era quando os empresarios para se solidarizar com outros capitalistas fechavam suas fabricas por tempo indeterminado, impedindo os trabalhadores de ter recursos para se sustentar.

era a luta de classes no seu formato mais cru. sem contar a violencia. obvio.

Anônimo disse...

Bom renato sua anaáise tem alguma razão... mas ela é falha. Então vo colocar aqui um texto meio grande, mas que tem como base minha experiência nesse um ano de movimento estudantil.

É óbvio, que uma greve estudantil não visa acabar com a produçao, simplismente parar a faculdade não resolve os problemas e essa é um discussão que o próprio movimento faz. daí nossas atividades de greve e etc...

Partindo dai vamos primeiro esclarecer uma coisa: A universidade é composta de 3 setores: professores, funcionários e estudantes. Quando professores ou funcionários entram em greve a situação é exatamente a dos trabalhadores.
Bem ou mal professores são trabalhadores e podem parar de trabalhar para reivindicar melhores condições de trabalho, isso pra mim não apenas é legítimo como óbvio.

Agora o outro caso os estudantes, o estudantes são dentro da universidade os único que tem como sua reivindicação principal as melhores condições de ensino, pois sua única relação com a universidade é de prestação de serviço*, que na verdade é o exercimento de um direito constitucional. (pode parecer absurdo mas quem conhece o histórico de greves da universidade sabe que professores e funcionários não pensam duas vezes na política quando se deparam com um aumento salarial suficientemente gordo)

Então temos uma questão, qual é o setor históricamente que vai mais a fundo nas discussões da universidade e que mais tem transformado ela no mundo desde a experiência de Córdoba?
os estudantes! e porque? porque esses são os únicos que discutem a qualidade da universidade e o acesso a ela.

Partindo daí vemos que os estudantes precisam ter suas ferramentas de manifestação tendo em vista que seus interesses não são representados pelas outras categorias. Qual ferramenta pode ser utilizada como forma de pressão dos estudantes contra a reitoria e o estado(universidade pública)???

Se analisarmos históricamente, no brasil e no mundo, só tem duas: A paralisação das aulas e a ocupação e paralisação de prédios públicos.
Essas táticas de repetem desde Córdoba, Maio de ¨68 na frança, Oxaca, universidade de chile e etc...

Então chegamos no ponto central, na sua questão o porque dessas formas.

Primeiramente partimos do ponto que o estado assim como a reitoria da universidade querem ela funcionando a todo vapor, formando o maior número de alunos possível.
A partir do momento que a universidade entra em greve e para! os dirigentes da universidade são pressionados a resolver os problemas e que as coisas retornem à normalidade.

No entanto, como vc claramente levantou, a universidade não é um fábrica onde cada dia parado para a produção e causa prejuízo. Por isso a greve estudantil é uma greve política! Isso significa dizer claramente que o simples fato dos estudantes nao estarem estudando não é suficiente para pressionar o governo. É necessário que se faça uso de mais mecanismos de pressão.

Quais mecanismos são esses? normalmente é o númerico dos estudantes para pressionar o governo frente a opnião pública. Passeatas, manifestações, eventos culturais e acadêmicos(estamos falando da universidade se nem aqui educação for armar, vai ser quando).

Então encontramos uma questão importante que provavelmente vira a sua mente, renatinho, "partindo do ponto que a greve em si não resolve porque não fazemos manifestações e só?

Pelo simples fato que enquanto professores cobram trabalhos, provas, leituras e etc... os estudantes(enquanto categoria) ficam muito desarticulados para se organizar.

A greve não é só um mecanismo de pressão! mas também é um momento de politização. Um momento no qual toda a universidade se vê obrigada a parar e discutir seus problemas. E isso, quando falamos de movimento estudantil, é indispensável.

Os estudantes não são uma classe social, a isso se dá sua heterogeneidade de opniões. Ou seja a reivindicação dos estudantes não é clara como de outros setores, que se resume a reivindicações trabalhistas.

Os estudantes discutem o modelo de univesidade, e isso não é apenas apontar defeitos no modelo atual mas propor novos modelos. O que envolve debate, contra posição de opniões.
A esse problema se soma o fato de que boa parte das informações que deveriam servir de base para esses discussões são negados aos estudantes(pelo menos no nosso estado) tendo em vista que na universidade não existe qualquer democracia. Por isso que quase todo periodo de greve alunos são obrigados a criar comissões que pesquisem tudo isso.

Bem toda essas coisas nao poderiam ser feitas com a aula andando? EM partes sim! pois a vida de um estudantes não é um agenda tão apertada assim!!

no entanto a experiência em movimentos como esse mostra que temos também que superar a apatia. Temos que nos preocupar em encher nossos foruns e politizar pessoas e isso infelizmente não se consegue fazer competindo com aulas. O que se consegue fazer são discussões com os mais interessados e essas são feitas, mas nao podem servir como base dos rumos do movimento.

Acho que todos os argumentos que mantém a greve como mecanismo de pressão dos estudantes eu já coloquei. Mas vou apenas citar históricamente para maior elucidação.

Se vc for atrás da história da USP, vai notar que tudo que conseguimos foi pela mobilização, ou seja, é total desconhecimento falar que ela nao funciona .
Só pra citar: A autonomia foi conquistada com uma greve em 89(questão por sinal debatida pelo florestan desde 82), o CRUSP a foi conseguido com uma ocupação por parte dos estudantes(toda assistência estudantil praticament foi conquista de greve), a autonomia do espaços estudantis foi conseguida assim tb(episódio famoso que Florestan ocupou juntamente com os alunos frente à tropa de choque), o aumento de verbas para uma porcentagem do ICMS, a expansão dos cursos noturnos, além do milhares de aumentos que professores e funcionários conquistaram até hj.

E agora fecho com dois casos bastante específicos que ocorreram na letras e que conheço de perto: greve de 2002 e de 2007.

Greve de 2002, falta de professores na FFLCH, Letras com classes de 400 alunos. Alguns professores(do latim e do grego) decidem que não vao dar aula pra um número maior de alunos do que o que cabe na sala.
Depois de uma semana de mais de 100 alunos sem classe nas matérias mais críticas a universidade entra em greve.

Apartir dali os alunos conseguem se organizar, e o horário de aulas foi todo tomado por grupos de debate. Seja debate de conservadorismo acadêmico da universidade como da infraestrutura do curso.

Os alunos levantam um dossiê com o número de professores necessários para que as metas didáticas fossem atingidas(salas de 40 alunos pra literatura e 20 para língua). Os cálculos sobre a questão da falta de salas do prédio e uma projeção desses problemas daqui alguns anos caso não sejam solucionados.

Foi um dossiê trabalhoso pra caralho!! sem dúvida, mas nunca havia sido feito!!! Os professores e a burocracia a universidade nunca tinha estudado a fundo os problemas estruturais do curso e muito menos atentado para as críticas que os alunos vaziam a ele.

Resultado: 4 meses de greve, 76 contrações para a Letras, 15 para o resto da FFLCH.
Avaliação do movimento: uma vitória, mas o número de professores ainda é insuficiente em 3 ou 4 anos o problema volta.

5 anos depois, 2007, A letras e FFLCH voltam a ter problemas sérios de vagas para matérias! Lotação de salas na FE(faculdade de Educação). E dos 76 professores só 36 foram contratados, o plano de metas atual preve os outro 30 mas eles nao suprem o número de aposentadorias do mesmo período.

O governado baixa um decreto que esquenta ainda mais as coisas, AS CONTRATAÇÕES DE PROFESSORES ESTÃO VETADAS NA LETRAS, além das questões da autonomia que não vou tratar aqui.

A letras entra em greve pela pauta unificada: revogação dos decretos. e pelas pautas específicas. Começamos então um periodo de pesquisas, comissões de alunos para discutir espaço, professores e grade curricular.
Vale dizer que essas comissões já existiam a meses mas eram compostas por 2 pessoas no máximo. Com início da greve elas crescem e trabalham a todo vapor.

E assim descobrimos que a grade horária do curso é absurda, nao é feita para 4 anos por isso ninguem se forma. Descobrimos que devido a uma lei federal serão incluidas matérias de licenciatura que não tem contratação de professores prevista, estrutura burocrática, salas nem espaço na grade para que aconteçam, descobrimos que o curso de línguas da letras funciona como uma fundação e nós nem podemos ter acesso aos documentos que regem seu funcionamento.

E ai??? quando alguém iria parar e perguntar pra gente o que achamos disso?!?
A mobilização obrigou os burocrátas e explicarem todo o plano da faculdade durante uma semana de debates e no segundo semestre outra semana será feita com o mesmo intuito.

Ou seja renatino, a greve não é APENAS a ferramenta de pressão mas tb uma ferramente a politização que gera a possibilidade de que discuta questões relativas a universidade.

E não acho que se perde com isso. Eu acho que se universidade pensa em formação(principalmente a FFLCH que visa a formação do pensamento crítico - florestan fernandes) que a greve é só uma perda curricular.

Realmente acredito que aquilo que a universidade deve formar é um ser que esteja disposto a pensar a universidade e a quem ela serve.

Acho que se deve esperar de um estudante de ensino superior público que ele não se atenha apenas as suas questões acadêmicas, mas que discuta as questões políticas disso tudo pois em cima dessas discussõe ele se forma também como pensador e isso é importante também!

Por exemplo, quando um aluno de letras para de discutir poesia e discute a vocação pedágogica do curso, discute o retorno que ele pode dar à população, quando organiza palestras de leitura crítica das obras de vestibular visando público de cursinhos e traz a discussão a da universidade pública pra eles tb. Eu sinceramente acredito que ele tb está ganhando em formação!

ESPERO TER FALADO TUDO PQ FALEI DEMAIS.

*veja bem renatinho, mais cuidado. não coloque os estudantes como consumidores porque educação nao é mercadoria e a relação que temos com ela não é de compra, nem de mercado

Anônimo disse...

bom para quem interessar mais esse tipo de discussão
Florestan Fernandes - A questão da USP
Tempos de greve na universidade pública- textos variado, eu nao sei o organizador... mas é da EDUNESP.

Renato Siviero dos Santos disse...

Chico, fique à vontade.

A discussão não existe quando só tem uma pessoa com o poder da palavra.

Anônimo disse...

"A discussão não existe quando só tem uma pessoa com o poder da palavra."

É... Acontece vc tem argumentos para rebater o que foi dito...